sábado, 25 de setembro de 2010

OBJETIVIDADE E SUBJETIVISMO

Faço parte de uma lista de discussão em que um integrante chamado Paul enviou este excerto da obra de Gustavo Corção, um grande pensador católico brasileiro que morreu em 1978. Senti-me confortado com o texto em virtude das minhas conclusões acerca do que vem ocorrendo com a sociedade brasileira. Tenho afirmado que trocamos o conhecimento pela opinião, o notório pela notoriedade e a verdade pelo bem-estar. Isso de certa forma explica porque de certas escolhas de nossa população nas artes, na cultura, na literatura, na religião e até mesmo na política. Corção antes de um filósofo era um profeta, pois a atual realidade é muito bem definida pelo pensador.

"O mecanismo da opinião pode ser descrito como uma interposição da vontade entre a inteligência e o objeto. A justa proporção com o objeto fica prejudicada, só podendo existir quando a inteligência está em livre confronto com o objeto, isto é, na contemplação.
Gostaria de tornar bem clara a imensa gravidade desse problema e a importância vital do restabelecimento, na estrutura de nossa pessoa, desse respeito pelo objeto, dessa abertura para fora pela qual tanto a inteligência como a vontade, a boa vontade, aspiram à suma objetividade. O grande desvio do pensamento moderno tem origem nessa inversão interior, pela qual a vontade se arroga um direito de conquista onde somente à inteligência cabe o primado. Todos nós, mais ou menos europeus, estamos impregnados de idealismo filosófico até a medula dos ossos, estamos convencidos que nossa dignidade mais alta reside nesse subjetivismo obstinado que tenta reduzir todas as coisas do céu e da terra a meia dúzia de opiniões. Muita gente pensa que isso é grandeza e marca de caráter e que a personalidade humana se define por esse fechamento diante dos objetos e se engrandece por essa deformação interior. Diante dos objetos mais simples o homem liberal, que agasalha suas opiniões, que desconfia de tudo que não seja o morno recôncavo de sua interioridade, cai em guarda numa posição crispada; a vontade mete-se de permeio entre a porta dos sentidos e a inteligência, e como o seu caminho é mais curto, ou porque seja ela mais ágil, sua sugestão chega antes do conceito e gera o preconceito. A inteligência perde a liberdade e a vontade então convence o sujeito de que ele é um livre-pensador.
É nessa questão nevrálgica da liberdade que a vontade mais se excita, e, no diálogo interior, clama que lhe pertence exclusivamente a decisão nessa matéria. Como na vida exterior vive sendo ofendida, esbarrando, chocando-se, atritando-se, a vontade procura se desforrar e volta-se para dentro. Volta-se contra o próprio sujeito, enrola-se no cerne nobre da pessoa e morde a inteligência. A liberdade psicológica e voluntariosa, nascida no conflito com as objetividades, substitui a liberdade ontológica que tem raiz na adequação entre a inteligência e o ser. O primado da inteligência é usurpado, e então, em vez do reto juízo, nasce a opinião.
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O senso da objetividade, a que já me referi nos capítulos anteriores, é aquele pelo qual a inteligência tende para o objeto e tem consciência de sua responsabilidade primeira no juízo. A diminuição desse senso gera o subjetivismo, a reivindicação do direito de opinião, o liberalismo, o voluntarismo, e todas as correntes filosóficas idealistas que buscam no objeto uma ressonância apenas do sujeito.
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E isso acontece porque a vontade interfere, mete-se entre o objeto e a inteligência, e procura se adequar à mobilidade, que é uma categoria proporcionada à sua essência. A atividade impera sobre a contemplação, o apetite domina o juízo, a opinião substitui a verdade.” (A descoberta do outro. Gustavo Corção)

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