quarta-feira, 3 de novembro de 2010

QUANDO A AMÉRICA TEMEU OS CATÓLICOS

Será que algum dia irão escrever um artigo entitulado "Quando o Brasil temeu os católicos"?


Boa leitura!

Tradução: Sandra Katzman

No início de 1900, muitos americanos ficaram genuinamente assustados pela percepção deles de uma ameaça religiosa vinda da Igreja Católica [Apostólica] Romana e por suspeitas de intenções imperialistas de seu líder, o Papa. Ele estaria tramando a derrubada dos Estados Unidos, advertiam os temerosos, a fim de "tornar a América Católica." Seus soldados, dezenas de milhares de católicos que se chamavam os Cavaleiros de Colombo, estariam ocupados armazenando armas e munições nos porões de suas igrejas, todos em preparação para o dia, quando seu líder papista daria o sinal para a insurreição violenta começar.

Os portadores de tais crenças não eram apenas alguns malucos extremos seguramente superados em número pelos seus vizinhos de olhos claros religiosamente tolerantes. Ao contrário, textos abertamente anti-católicos muito populares vertiam das bancas de todo o país, em jornais como o Jeffersonian do senador Tom Watson, de Atlanta e o Menace de Aurora, Missouri, cujas assinaturas superavam as dos maiores jornais de Nova York e Chicago juntos. As eleições foram ganhas com base nas promessas de afastar os católicos dos cargos públicos de confiança. Apenas "os americanos verdadeiros" deviam ocupar essas posições, anunciavam, não os católicos, que eram leais primeiro ao seu líder religioso em Roma.

Deputados e senadores estaduais foram também persuadidos a tomar medidas contra a detectada ameaça, refletindo assim o medo anti-católico em suas "leis de inspecção de conventos." Essas leis, pouco lembradas hoje, autorizavam as buscas sem mandado em edifícios Católicos - conventos, mosteiros, igrejas e casas paroquiais – em procura de armas e mulheres jovens supostamente seduzidas a entrarem para um convento de freiras através de mentiras católicas.

O temor religioso nesta escala teve consequências fatais. Oitenta e nove anos atrás, em Birmingham, Alabama, em meio a essa atmosfera anti-católica burbulhante, o padre James E. Coyle foi brutalmente assassinado. Coyle, natural da Irlanda, foi enviado aos Estados Unidos para iniciar o seu sacerdócio. Quando ele se atreveu a levantar-se em defesa de sua fé, agentes federais advertiram o bispo de Mobile sobre ameaças de morte `a vida de Coyle e promessas de queimar sua igreja em Birmingham.

Tais ameaças não eram sem valor. Durante este mesmo período, a popularidade da Ku Klux Klan explodiu depois de se redefinir como uma organização "patriótica" fraterna dedicada a salvaguardar os Estados Unidos contra a ameaça de católicos, judeus e imigrantes que inundavam o país em números sem precedentes. Este novo Klan atraiu alguns dos "melhores homens da cidade" - médicos, advogados, juízes, policiais, até mesmo os clérigos.

Em 11 de agosto de 1921, um desses homens - um pastor metodista, o reverendo Edwin R. Stephenson – foi com uma arma carregada para a varanda da casa de Coyle e matou-o em frente a uma rua cheia de testemunhas. Cerca de uma hora antes, o padre tinha aparentemente cometido o ato imperdoável de celebrar o matrimônio da filha de 18 anos de Stephenson com um católico praticante com descendência de Porto Rico, e cuja profissão era aplicar papel de parede.

A KKK reagiu rapidamente a esta iniciativa, levantando fundos para a defesa de Stephenson e contratação de seu principal advogado, um jovem futuro juiz da Suprema Corte, Hugo Black. Black, esperava-se, poderia convencer um júri do Sul a ver Stephenson como um herói da comunidade ao invés de um assassino intolerante. Os artigos publicados no Menace durante todo o julgamento batiam no mesmo tema, colocando uma das preocupações mais fortes da época contra a própria justiça. Você pode adivinhar o resultado.

Stephenson saiu do tribunal um homem livre, e ele nunca nem mesmo se desculpou. Black se juntou ao Klan 18 meses depois e, com seu apoio, foi eleito para o Senado dos EUA. Só anos mais tarde, depois de um repórter revelar sua adesão quando ele se preparava para assumir sua cadeira no Supremo Tribunal Federal, ele calmamente afirmou que não partilhava mais das crenças do Klan e não era mais um membro. Black sobreviveu ao escândalo que se seguiu.

Na época, esses homens não se consideram fanáticos religiosos. Eles acreditavam que eram patriotas, bons pais e filhos, maridos e irmãos protegendo suas famílias e a nação contra uma ameaça externa que eles temiam ter como intenção a sua destruição.

A febre anti-católica dos anos 1920 não era uma história regional, era uma história americana, se estendendo ao norte, leste e oeste, caracterizando os católicos como cidadãos de segunda classe por décadas. E continuou por mais de 40 anos, só terminando quando o candidato presidencial [católico] John F. Kennedy se sentiu obrigado a dizer diretamente que sua lealdade era para com os Estados Unidos, e não para com o Papa. Se as conseqüências tivessem sido menos terríveis e se não houvessem tantos sinais de que não aprendemos com nossos erros, hoje, a pior consequência do fervor anti-católico poderia ser apenas vergonha.

Sharon Davies é professora da Universidade Estadual de Ohio Moritz Faculdade de Direito e autora de "Road Rising:. Um conto verdadeiro de amor, raça e religião na América" Ela escreveu esse artigo para o Los Angeles Times (McClatchy-Tribune).
Leia o original em inglês aqui.